Dois mineiros ensinam a receita do legítimo Pão de Queijo
Helmuth Kühl
Pãezinhos, prontos para ir ao forno
O multiculturalismo brasileiro rende boas conversas nas aulas de inglês que frequento. São três paranaenses, uma sul mato-grossense, uma catarinense e um professor mineiro, que morou nos Estados Unidos, falando sobre sotaque, clima, hábitos e culinária, um dos tópicos mais estimulantes.
Nesses diálogos fiquei sabendo que Coxim, no Mato Grosso do Sul, é a capital do peixe; que nem todo mundo vê graça em pinhão e que falta sal no prato que comi de me lambuzar a vida toda, o pão de queijo. Pior, falta queijo.Claro que receita cada um segue como quiser, mas eu precisava aliviar a desilusão de ter comido uma espécie de biscoito de polvilho por pão de queijo a vida toda. Tinha um jeito de resolver, provar a receita nascida nos sítios e fazendas dos interiores de Minas Gerais.Você vai ficar surpreso de fácil que é, disse mineiramente Valber Sales, o professor de inglês.
Helmuth Kühl
Polvilho…
Ele sabe a receita, mas sua mãe, além de saber, é cozinheira profissional há 14 anos, motivos suficientes para convidar ambos para preparar o pão de queijo in loco, na cozinha do salão de festas do Grupo Diário.
Zilneia Sales trabalha em um restaurante de culinária brasileira, mas já passou por cozinhas típicas italianas e irlandesas nos Estados Unidos. Seu rigor com a higiene e a habilidade em preparar e misturar ingredientes atestam o talento – ela quebra ovos com uma mão só! A família veio de Ipatinga para o Sudoeste atrás de Valber, estudante na UTFPR.
Das várias cidades brasileiras em que foi aprovado no Sisu, sistema de seleção que permite concorrer simultaneamente a vagas em diferentes universidades, ele preferiu Pato Branco, pelo alto índice de qualidade de vida e baixa criminalidade. Mãe, irmão e pai vieram depois, pelos mesmos motivos.
Meio polvilho, meio queijo
Sobre a origem do pão de queijo existem muitas histórias e pouco consenso. A versão de Zilneia diz que se produzia mais queijo em Minas do que era possível comer antes de estragar, e por isso receitas acabaram sendo criadas para dar vazão à abundância.Esse trecho corresponde a parte da história mais repetida na internet sobre o assunto.
Helmuth Kühl
…queijo…
A outra parte diz que a receita surgiu durante o século 18, época em que era comum servir pão e café aos senhores das fazendas. Só que a farinha que chegava nos confins de Minas Gerais não era das melhores, e as cozinheiras passaram a usar polvilho no lugar. O segredo é exatamente equilibrar a quantia de queijo e de polvilho. Precisa ser meio a meio. Usamos:
– 500 gramas de polvilho doce
– 500 gramas de queijo, o suficiente para fazer mais ou menos 40 bolinhas até que robustas. O queijo ideal é o Minas, mas o colonial meio cura, aquele mais amarelinho por fora, resolve bem.
Também será preciso:
– 3 ovos
– 1 xícara de leite integral
– 1 xícara de óleo de soja
– 1 xícara de água e sal.
Bora fazer
Vista luvas de plástico e touca. É higiênico, palavra de cozinheira profissional. Rale o queijo, nem muito fino nem muito grosso, e reserve-o em uma bacia. Coloque todo o polvilho em outra bacia, ele será escaldado. Em uma leiteira, ou outro recipiente de alumínio, misture a água, o leite, o óleo e sal a gosto – nós usamos duas colheres, mas segundo a especialista, ficou um pouquinho salgado. Pode ter sido culpa do queijo colonial, que já é salgadinho.
Helmuth Kühl
…ovos…
Aqueça toda essa mistura até ferver, e em seguida despeje aos poucos no polvilho enquanto o mexe com uma colher de metal. Aí vem o queijo, que deve ser misturado ao polvilho. Acrescente-o e misture aos poucos com a mão, é mais fácil.A massa que surgir disso precisa ser esfriada. Coloque na geladeira por uns dois minutos. Isso é necessário para que os ovos, o próximo ingrediente, não cozinhem. Acrescente os três ovos e mexa, também com a mão. A mistura precisa ficar gosmenta, como mostrado na foto X. Se não ficar, taca-lhe mais um ovo.
Helmuth Kühl
…a massa.
Prontinho, agora é só fazer as bolinhas. Untar a forma é desnecessário, pois a massa já tem óleo. Acredite, não gruda. Deixe o forno aquecendo por 10 minutos a 180 ºC, depois deixe assando por mais 10 minutos. Quando o pão de queijo estiver douradinho por fora já dá pra provar.
Trem bom
Na cozinha não tinha fogão, mas tinha um forno à lenha, pra deixar a coisa ainda mais tradicional. Foi preciso só cinco minutos de forno pra começar a cheirar – e que cheiro bom – e pouco mais de 10 pro trem ficar douradíssimo.Crocante por fora e molinho por dentro. Todos no recinto concordaram, o pão de queijo de Minas é bom demais da conta, sô.
Helmuth Kühl
Zilneia e Valber Salles, mineiros preparando uma das mais gostosas mineirices